Raphael Bózeo
Bico da Coruja: filme foi pontapé para série de documentários sobre Macaé
Atualizado: 18 de nov. de 2021
O verdadeiro embrião do projeto Pelos Cantos de Macaé foi o documentário que fizemos sobre o Bico da Coruja, chamado "O Estreito Botequim", exibido no instagram e financiado através do edital Cultura Presente nas Redes, do Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Agora, mais quatro documentários serão exibidos na última semana de novembro nas redes sociais do Projeto Pelos Cantos de Macaé. As histórias contadas serão da Confraria Samba Choro e Poesia, Lyra dos Conspiradores, Nova Aurora e o Gourmet Musical do Sentrinho.
Desde 2014, quando retornei a Macaé após uma saborosa e cansativa jornada no Rio de Janeiro, passo a frequentar aquele pequeno, modesto, charmoso e musical botequim. Ali coleciono registros em vídeo, fotografias e ótimos momentos.
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Aquele espaço com quase 40 primaveras brinda a cultura de Macaé com muito choro e samba. É realmente de encantar qualquer cidadão que ame cerveja gelada, resenha bem falada e brincadeiras engraçadas.
Tudo isso me fez querer documentar esse canto encantado da cidade. Foi aí que surgiu esse documentário, que lhe mostro agora, abaixo:
A partir daí surgiu o desejo de contar a história de outros espaços culturais da nossa Princesinha do Atlântico, outros cantinhos daqui.
Foi aí que nasceu o Pelos Cantos de Macaé. É só o começo. Macaé tem muitas histórias e causos que precisam virar memória viva.
Para fechar o nosso papo aqui, vou te contar uma historinha. Você sabia que o Bico da Coruja, reduto do choro, fica na Rua Compositor Benedicto Lacerda? Logo Benedicto, macaense e um dos maiores chorões do nosso país? A curiosidade, acredite, é pura coincidência do destino (ou não!).
Certa quarta, saindo do Bico lá pelas tantas, calibrado após algumas boas cervejas, confesso, viajei na maionese. Alterado pelo abastecimento alcoólico no meu motor 1.0, imaginei Benedicto Lacerda, falecido em 1958, ali conosco no Bico da Coruja. O que ele faria?
Aí fiz esse texto na madrugada (e precisou ser revisado no dia seguinte após um pão com manteiga e um café sem açucar para curar a ressaca).
Vou ao Bico pedir benção a Benedicto
O grande Benedicto Lacerda arrumou algo muito especial para fazer depois da sua partida para o plano superior. Em um dos meus sonhos, o encontrei. Estava em frente ao pequeno bar Bico da Coruja, em Macaé, com sua quase centenária e inseparável flauta. Sorriso aberto e um chapéu, no estilo “um pouco de lado”. Calças brancas e uma blusa para dentro, bem surrada, clara.
Era uma tradicional quarta-feira de chorinho no Bico. Lá estava uma formação de craques da música, além de Wallace Agostinho, a grande Coruja do Bico. Logo na frente, Benedicto. Sentado em um pequeno banco de madeira.
Fiquei na dúvida. Ouço as belas canções ou aproveito a oportunidade para conversar com o grande Lacerda. Afinal, somente eu tive esse privilégio de embarcar nessa viagem que misturou o passado e o presente. Sabia que a passagem de volta para o mundo real estava comprada, aconteceria muito brevemente.
Resolvi observar. A cada nota acertada daquele grupo de chorões, um sorriso do Maestro. A cada tentativa errada, uma palavra de incentivo. Percebi que Benedicto estava feliz. Contente por ver uma invenção durar tanto tempo, afinal, foi um dos primeiros chorões. Voltou ao passado, mas curtiu o presente. Seu grande parceiro, Pixinguinha, não estava ali. Provavelmente protegendo algum outro reduto musical. E o Bico era uma responsabilidade exclusivamente do Benedicto.
Poucos minutos depois, olho para o banquinho e Lacerda não estava lá. O dito cujo caminhava naquela noite rara, passou pela fábrica de gelo e chegou à casa onde morou. Foi matar a saudade. Em outro ponto, leu a placa “Rua Benedicto Lacerda”, recordando a homenagem.
Verificou se estava tudo no lugar correto naquele logradouro. Tomei a liberdade e cheguei próximo. O reverenciei sem pronunciar uma palavra. Voltou ao bar, entrou e sem muito alarde abençoou Wallace. Não ouvi o que disse no pé do ouvido do rabugento dono, mas percebi dois sorrisos de canto de boca. Segundos depois, a toalhinha no ombro enxugou o suor no rosto do mentor (encarnado) daquele cantinho.
Benedicto sentou novamente no banquinho. Virou espectador. Aplaudiu. Foi de músico em músico deixar o seu afago. Estava na cara, fã número 1 do Bico. Anjo da guarda. Fiel escudeiro.
O choro estava chegando ao fim e Benedicto não segurou o seu choro. De alegria. De felicidade. De saudade. E então partiu. Caminhou sozinho com a certeza que voltaria para abençoar os chorões.
Acabo de acordar. Foi realmente um sonho. Mas hoje é quarta. Vou ao Bico, pedir benção a Benedicto.
Pelos Cantos de Macaé é uma das iniciativas que foram contempladas pelo edital “Retomada Cultural RJ” e é apresentada pelo Governo Federal, Governo do Estado do Rio de Janeiro e Secretaria Estadual de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro, com a Lei Emergência Cultural nº 14.017/2020, mais conhecida como Lei Aldir Blanc. A empresa Bózeo Fotografia também é realizado do projeto.